Introdução: O Monge e o Moribundo
Eu dormia com dores. Eu dormira horrores.
Estava abraçado com minha katana, com meus cortes no abdomên e a minha tenebrosa agonia. Eu respirava o odor do vazio do meu espírito, da podridão dos meus atos, enquanto sentia o latejar dos meus olhos. Queria ficar lá, jogado. Queria ter alguma coisa que me fizesse sair de lá, ao mesmo tempo. Poderia pensar inúmeras situações melhores que meus furos, minha catalepsia e meu medo remexido pelo terror de estar naquele ponto. Os ferimentos respiravam e secavam o sangue escorrido, misturado aos meus trapos (...).
Ressoava pelas paredes o som de alguma guitarra perto daquela rua estreita. Uma guitarra estrindente, mas de som afinado e melodia ritmada. Via também alguns traunsentes locais, uma vila isolada do resto do mundo. Um fato fora do comum direcionava os olhares daquelas pessoas preocupadas com o escândalo da última semana, uma corja de fúteis de mente pequena e fracos de espírito. Fazia anos que não se via um cavalo naquela região, e naquele dia eles viram também algo muito fora do comum.
O músico desse instrumento era um cavaleiro vestido de branco, com um rabo de cavalo alto e muito curto. Cobria o corpo com dois kimonos, um de ombros largos e o de baixo feito com lã, para suportar o inverno, provavelmente. Não duvido que carregava também uma malha de ferro, ou na mala ou mesmo por baixo daquela vestimenta. Ele não era um religioso qualquer, pois carregava armas de fogo e flautas na sela do eqüino. Fiz um esforço sobrehumano e me pus em pé, quase tendi o corpo para frente e caí de nariz. Usei a minha espada curta para andar à passo curto. Segui a procissão, que acabou dispersando: o misterioso homem apressou-se e sumiu no final da rua.
Decidi abandonar aquele bandos de fúteis e andei em sentido oposto. Precisava encontrar um hospital, uma curandeira qualquer ou algum lugar pra me embriagar. A bebida diminuía a resistência, mas me tiraria dali sem pedir duas vezes. Dei algumas passadas até que meu joelhou deu um passo em falso e eu desmoronei. Cuspi sangue e olhei aquela superfície gélida e fofa, os sinais do inverno. Não estava com disposição, novamente, de pensar em algo.
Senti então o ferro passando entre meus fios crespos de cabelo, resvalando suavemente por minha nuca. Virei devagar a cabeça e semicerrei meus olhos. Era o mesmo kimono do cavalo.
- Devo me mover? - suspirei rouco.
- Não, nem tampouco quero ameaçar-te - disse, convicto - entretanto, se reagir, está morto. Ainda tem disposição para levantar, Alexander?
- Tenho tanta disposição quanto essa neve morta...
- Então durma!
Ele tentou bater em mim, mas eu sozinho relaxei meus músculos e mergulhei em sono profundo. Aquele estranho carregou meu corpo pesado e o ergueu até o cavalo. Quando partimos daquela vila miserável a neve caía. Enfrentamos tempestade.
Estava abraçado com minha katana, com meus cortes no abdomên e a minha tenebrosa agonia. Eu respirava o odor do vazio do meu espírito, da podridão dos meus atos, enquanto sentia o latejar dos meus olhos. Queria ficar lá, jogado. Queria ter alguma coisa que me fizesse sair de lá, ao mesmo tempo. Poderia pensar inúmeras situações melhores que meus furos, minha catalepsia e meu medo remexido pelo terror de estar naquele ponto. Os ferimentos respiravam e secavam o sangue escorrido, misturado aos meus trapos (...).
Ressoava pelas paredes o som de alguma guitarra perto daquela rua estreita. Uma guitarra estrindente, mas de som afinado e melodia ritmada. Via também alguns traunsentes locais, uma vila isolada do resto do mundo. Um fato fora do comum direcionava os olhares daquelas pessoas preocupadas com o escândalo da última semana, uma corja de fúteis de mente pequena e fracos de espírito. Fazia anos que não se via um cavalo naquela região, e naquele dia eles viram também algo muito fora do comum.
O músico desse instrumento era um cavaleiro vestido de branco, com um rabo de cavalo alto e muito curto. Cobria o corpo com dois kimonos, um de ombros largos e o de baixo feito com lã, para suportar o inverno, provavelmente. Não duvido que carregava também uma malha de ferro, ou na mala ou mesmo por baixo daquela vestimenta. Ele não era um religioso qualquer, pois carregava armas de fogo e flautas na sela do eqüino. Fiz um esforço sobrehumano e me pus em pé, quase tendi o corpo para frente e caí de nariz. Usei a minha espada curta para andar à passo curto. Segui a procissão, que acabou dispersando: o misterioso homem apressou-se e sumiu no final da rua.
Decidi abandonar aquele bandos de fúteis e andei em sentido oposto. Precisava encontrar um hospital, uma curandeira qualquer ou algum lugar pra me embriagar. A bebida diminuía a resistência, mas me tiraria dali sem pedir duas vezes. Dei algumas passadas até que meu joelhou deu um passo em falso e eu desmoronei. Cuspi sangue e olhei aquela superfície gélida e fofa, os sinais do inverno. Não estava com disposição, novamente, de pensar em algo.
Senti então o ferro passando entre meus fios crespos de cabelo, resvalando suavemente por minha nuca. Virei devagar a cabeça e semicerrei meus olhos. Era o mesmo kimono do cavalo.
- Devo me mover? - suspirei rouco.
- Não, nem tampouco quero ameaçar-te - disse, convicto - entretanto, se reagir, está morto. Ainda tem disposição para levantar, Alexander?
- Tenho tanta disposição quanto essa neve morta...
- Então durma!
Ele tentou bater em mim, mas eu sozinho relaxei meus músculos e mergulhei em sono profundo. Aquele estranho carregou meu corpo pesado e o ergueu até o cavalo. Quando partimos daquela vila miserável a neve caía. Enfrentamos tempestade.